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Filme: Trinta – A história do maior carnavalesco dos últimos tempos, por Paulo Câncio
O Filme narra a trajetória de Joãosinho Trinta, que personifica o arquétipo da caminhada de muitos artistas de alma com seus sacrifícios, riscos e foco rumo à expressão da arte. Década de 60. Natural de São Luís do Maranhão, muda-se para o Rio de Janeiro. Por intermédio de um conhecido, com algum grau de influência, consegue um emprego como datilógrafo. Precisa de um meio para se manter enquanto, em paralelo, busca uma oportunidade, para trabalhar como artista. E esse momento chega quando, em uma audição, ele é selecionado para integrar o corpo de baile do Teatro Municipal. Largar um emprego seguro, diante daquela possibilidade, é algo que o chefe de João não entende e que para os colegas é motivo de riso. João, com humildade, gratidão, e até uma certa dose de humor, se mantém firme na sua decisão.
Após uma apresentação no teatro, João recebe a visita do benfeitor que lhe conseguiu seu antigo emprego. O homem está, declaradamente, indignado. Em suas palavras, João largou um emprego digno e de homem para fazer algo vergonhoso. Naquela época, a profissão de artista não tinha reconhecimento e um homem ser bailarino era inaceitável. Para João, o que importava é que ele estava feliz por fazer o que gostava. A opinião pública de seus conterrâneos era irrelevante diante da realização que sua atual vida lhe proporcionava.
Foi proposto a João ganhar dinheiro extra ajudando na cenografia. Seu trabalho era a confecção artesanal de máscaras. Ele pesquisou na biblioteca do teatro sobre aspectos culturais relacionados ao espetáculo em que as máscaras seriam usadas e criou um modelo próprio que foi adotado como modelo padrão. Sua especialização, como autodidata, em alegorias, lhe renderam o cargo de chefe de guarda roupa e, depois, de cenógrafo. Mas a sede de brilho no palco lhe cutucava o coração. Seu superior no teatro disse que era hora de ele conhecer o Barracão.
O Barracão era uma estrutura voltada para organizar e efetuar o desfile da escola de samba Salgueiro. João se tornou assistente de Fernando Pamplona, carnavalesco, responsável por definir o enredo do desfile e desenvolvê-lo. Passaram-se alguns anos, chegando a década de 70. Pamplona se incompatibilizou com o coordenador geral da Escola. Demitiu-se, 6 meses antes do carnaval. João foi chamado para substitui-lo. Isso desagradou a Sebastião, diretor do Barracão, responsável pela parte operacional da montagem do enredo, que cobiçava o cargo de carnavalesco. Desagradou, também, a Pamplona, que duvidava que João fosse capaz dar conta do recado. O Barracão era uma estrutura de poder e, aos olhos de Pamplona, demandava um administrador de pulso firme e não um artista. João aceitou o desafio. Não foi visto com muito respeito, sobretudo porque resolveu não usar o enredo já aprovado do carnavalesco (isso era uma questão de ética e de demanda interna de expressar sua arte).
Ele mergulhou de corpo e alma sacrificando, com frequência, o sono e se esquecendo de parar para comer. O enredo apresentado foi aprovado pelo coordenador geral, mas não foi aceito de bom grado pelos outros envolvidos. João tinha leveza no falar, mas sabia ser firme. À medida que o trabalho foi sendo desenvolvido, as pessoas foram pouco a pouco sendo conquistadas. João foi um visionário e suas ideias confusas, para as mentes de muitos, passaram a fazer sentido à medida que foram tomando uma forma concreta. As dificuldades de um prazo apertado e as colocadas pelos opositores foram contornadas com imaginação, dedicação e apoio dos que se convertiam em aliados de João, motivados por sua arte e por sua auto entrega ao projeto.
Vale destacar a analogia que João faz da ópera com a escola de Samba – ambas tem enredo, fundo musical (orquestra/bateria) e pessoas que dançam contando uma história. Outro fato interessante foi a ousadia de propor mudanças na música do compositor – algo sem precedentes – para combinar com os adereços, formando um todo harmônico. Ele tinha tanto a visão do todo quanto a precisão em pequenos detalhes.
O desfile foi considerado revolucionário e o Salgueiro ficou em primeiro lugar. Joãosinho Trinta se consagrou como carnavalesco, sendo mentor da escola de samba vitoriosa em muitos carnavais. Esse foi seu sonho de artista – o arquétipo do artista nato!
Trinta é um filme brasileiro produzido em 2012 e escrito por Claudio Galperin, Paulo Machline, Felipe Sholl e Mauricio Zacharias e com direção de Paulo Machline, o longa-metragem é baseado na história de vida do carnavalesco Joãosinho Trinta. Estreou em 18 de outubro de 2014 pela FOX Filmes.
Conta com Matheus Nachtergaele, Milhem Cortaz e Paolla Oliveira no elenco central da trama. Sinopse: Cinebiografia do carnavalesco Joãosinho Trinta, mostrando sua vinda de São Luís, no Maranhão, até o Rio de Janeiro. Seu início de carreira como bailarino, a ida para o Salgueiro e a estreia como carnavalesco pela escola. Saiba mais… (Fonte Wikipédia).
Resenha do Livro Casa de Pensão, de Aluísio Azevedo, por Marcelo Elo Almeida
Casa de Pensão é um clássico da literatura do século XIX, muito representativo do comportamento e dos valores de parte da sociedade carioca pré-republicana. Conta a história do jovem Amâncio, um rico herdeiro maranhense que vem para o Rio de Janeiro com a desculpa de cursar Medicina. De fato, desculpa. Nada afeito aos estudos nem ao trabalho, mas possuidor de uma carga sensual e libertina muito forte, o Rio de Janeiro representa para ele a saída do jugo de seu pai e a realização dos seus sonhos e desejos carnais com total liberdade, bancado pelo dinheiro da família.
Logo na sua chegada, e hospedado em casa de Campos, um amigo de seu pai que também torna-se um tipo de correspondente financeiro, já corteja a mulher de seus anfitrião, sem qualquer escrúpulo. Não tendo sucesso em suas investidas iniciais, muda-se logo para a casa de pensão de Madame Brizzard, mulher de seu novo amigo de farra, João Coqueiro. Ali, ele conhece Amélia, irmã mais nova daquele, bonita e solteira, que logo desperta a sua atenção e desejo. Buscando satisfação de seus impulsos, também tenta a sorte com outra hóspede, também casada, Lúcia, que, interessada em sua condição financeira, faz o jogo de sedução.
Mal sabe Amâncio que o convite de Coqueiro para hospedar-se na casa de pensão de Madame Brizzard já continha a intenção sobre sua fortuna, jogando com a atratividade da própria irmã e em conluio com elas. Achando-se predador, Amâncio acaba tornando-se presa. Após idas e vindas, tentativas de aproximação e sedução, Amélia acaba “cedendo” às suas investidas, enredando-o em despesas financeiras extraordinárias, com sexo e manipulação. Ciente disso, e não se importando com o jogo, desde que estivesse sexualmente satisfeito, Amâncio continua a buscar aventuras com Lúcia e Hortênsia, esposa de seu primeiro anfitrião.
Nesse enredo de interesses inconfessáveis Aluísio Azevedo demonstra sua capacidade literária. Desnudando as dissimulações nas situações mais corriqueiras, seja à mesa de jantar ou numa conversa de escritório, os personagens estão a todo tempo representando um papel, de modo cínico e velado, sempre em defesa de seus interesses mais mesquinhos. Campos, Hortênsia e a mãe de Amâncio são os únicos a guardar comportamentos moralmente corretos ou defensáveis, pois dos outros só falsidades e conveniências são descritas. Não por acaso, são esses os personagens que mais sofrem com traições e enganos de toda sorte, justamente por serem os mais honestos. O autor descreve a incoerência entre o que vai à cabeça de cada personagem e suas palavras, demonstrando uma hipocrisia que para ele é uma patologia social, sempre a buscar a manipulação de fatos e pessoas por interesses.
Merece também destaque a forma como são tratadas as pessoas que não oferecem nenhum benefício aos personagens principais. O hóspede tuberculoso à beira da morte, tratado como estorvo por Madame Brizzard e pelos outros moradores, ou a escrava da pensão, nominada apenas como mucama, objeto para satisfação sexual de Coqueiro na calada da noite, ou ainda o menino Sabino, escravo lembrado apenas para todo tipo de serviço e extravasamento das irritações de seus proprietários.
Ao longo de mais de trezentas páginas, tendo como cenário quase exclusivo o ambiente da pensão, a história pode muito facilmente ser adaptada para um roteiro de teatro, onde a dissimulação seria o personagem mais presente no tablado. Entradas e saídas de cena de cada personagem com suas falas e comportamentos contraditórios em meio a jantares e valsas comporiam uma comédia, não fosse pelo final trágico, inspirado na Questão Capistrano, crime que abalou a Corte na década de 1870. Existem diferenças substanciais entre o caso concreto e a obra de ficção, ainda bem. No primeiro, trata-se de uma vingança pela desonra da irmã, ao passo que no livro o que se passa é o ódio profundo de Coqueiro, que personifica o egoísmo. Mas ambos explicitam, cada um a seu modo, a hipocrisia social.
Também é de se notar como o trabalho é uma questão ausente no enredo. A teoria da indignidade do trabalho, de que esforço físico e dedicação são coisas para a ralé e para os escravos, é reforçada na presente obra, mesmo que essa não tenha sido a intenção do autor. Aliás, esse é um fenômeno que perpassa boa parte da literatura do século XIX (Brás Cubas, de Machado de Assis, vivia do que mesmo?). Quando Madame Brizzard consegue se mudar para uma outra casa para onde quase não vão hóspedes antigos, ela respira aliviada, já que não teria mais tanto trabalho, mesmo que isso lhe custasse o próprio sustento. Mas havia um provedor rico que os acompanharia, o provinciano Amâncio, que aceita pagar o preço que o sexo lhe impõe.
Aluísio viria a dar um passo à frente em sua literatura, ao lançar alguns anos depois “O Cortiço”, marco do naturalismo, revolucionando a temática da literatura brasileira do século XIX. O mérito de Aluísio Azevedo é explicitar aquilo que, pelo jeito, era um costume dissimulado na Corte, bem como o parasitismo de boa parte da sociedade carioca, palco já à época dos desfiles de entrudos e cucumbis, o nosso proto-carnaval, manifestação onipresente no Rio de Janeiro e que, durante quatro dias, suspende a nossa hipócrita hierarquia escravagista. Pois o Carnaval também é isso: quebra momentânea das estruturas morais e sociais limitadoras de uma vida plena e feliz.
Casa de pensão (1884), romance de Aluísio Azevedo estruturado segundo os padrões estéticos do Realismo-Naturalismo, relata a vinda do maranhense Amâncio de Vasconcelos ao Rio de Janeiro e a sua estada na Corte ao cursar o primeiro ano na Escola de Medicina. Os estudos afiguram-se maçantes para esse provinciano que anseia por aventuras amorosas na cidade carioca. A hospedagem na pensão de João Coqueiro e de Madame Brizard representa a independência sonhada e suas desventuras. À luz das teorias deterministas, as páginas descrevem a rotina local, sublinhando com fina ironia a degradação e a imoralidade que caracterizam o pensionato. Saiba mais…
O Estereótipo do Malandro, por Kike Cárcamo
Malandro é um adjetivo que se tornou popular no imaginário brasileiro ainda na época da escravidão e, originalmente, era utilizado como uma forma de discurso racista contra afrodescendentes, sendo que ganhou força com a abolição da escravatura. Com o tempo, tornou-se uma expressão para designar uma pessoa que se utiliza da esperteza para sobreviver sem trabalhar, geralmente abusando da confiança de outras; vadio. Diz-se de quem é esperto, astuto; sagaz. Ou ainda indolente, preguiçoso.
O estereótipo do típico malandro brasileiro surgiu na primeira metade do século XX. Carregado de um certo romantismo, foi principalmente imortalizado pelas letras de samba, no Rio de Janeiro, como parte da boemia, hábil no jogo, na arte da conquista, bom de copo de dança e de briga.
Alguns historiadores afirmam que a malandragem seria uma expressão de desobediência civil por parte da população recém-liberta da escravidão, que não recebeu qualquer ajuda do governo e continuou sendo vítima de racismo. A malandragem seria a forma que essa população encontrou de não continuar submetendo a própria força de trabalho ao aviltamento.
Na literatura brasileira, a primeira referência ao malandro foi feita pelo escritor Manuel Antônio de Almeida, com o personagem Leonardo, na obra Memórias de um sargento de milícias, escrito em 1852, curiosamente, seu único livro. De Almeida era médico e jornalista, tendo sido redator do jornal Correio Mercantil, no Rio de Janeiro. Era um apaixonado pela cultura popular carioca, fez parte da primeira sociedade carnavalesca na “cidade maravilhosa”, o Congresso das Sumidades Carnavalescas, fundado em 1855. O romance retrata as classes média e baixa, algo muito incomum para a época, porque os ambientes aristocráticos eram a voga do momento. A experiência de ter tido uma infância pobre influenciou Manuel Antônio de Almeida no desenvolvimento de sua obra.
Como tema acadêmico, o malandro foi estudado por grandes expoentes da sociologia e da crítica literária, como o ilustre professor da USP, Antônio Cândido de Mello e Souza. Considerado um dos grandes expoentes da crítica literária brasileira, foi o autor de Dialética da Malandragem, pela Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, publicado em 1970 pela USP. Neste artigo, ele mostra como o conceito de malandro foi sendo modificado através do tempo, sendo que o livro de Manuel Antônio de Almeida foi utilizado como exemplo por José Veríssimo que, em 1894, definiu Memórias de um sargento de milícias, como romance de costumes, com o uso de uma estética do Naturalismo, sendo o malandro um anti-herói.
O conceito de malandro só voltou a ser tema da literatura brasileira com a fantástica obra de Mário de Andrade, Macunaíma, de 1928, que contém elementos da cultura indígena e afro-brasileira. Com uma narrativa nacionalista, de caráter crítico, Macunaíma é o “herói sem nenhum caráter”. Embora o personagem principal seja um índio da Amazônia, ele apresenta traços do malandro que apresenta um gênero mais amplo de aventureiro astucioso, comum a todos os folclores. Macunaíma tem como característica principal a diversidade cultural brasileira.
O que a maioria do povo brasileiro não sabe, é que o malandro tem um papel fundamental na Umbanda, religião brasileira que incorpora elementos indígenas e africanos. Na Umbanda, eles servem como intermediários entre os mundos espiritual e físico, e são reverenciados pela inteligência, astúcia e capacidade de navegar pelas complexidades da vida.
Curiosamente, seu Zé é a única entidade da Umbanda que é aceita em dois rituais diferentes e opostos: na “Linha de Esquerda” com o ritual do “Povo de Rua” (Exus, Pomba Giras e Mirins), e “Linha das Almas” (Caboclos e Pretos-Velhos). Tal falange começou com um ser humano, José Pereira dos Anjos (há quem diga que seu nome verdadeiro era José Gomes da Silva), mais conhecido como Zé Pilintra, o “médico dos pobres e advogado dos injustiçados”.
Pouca coisa se sabe sobre sua origem. Original do sertão de Pernambuco, Zé Pilintra era um afrodescendente alto e forte que se mudou para o Rio de Janeiro e frequentava a boemia carioca, tendo se tornado um personagem popular nas noites da Lapa do início do século XX. De origem humilde, passou boa parte da vida procurando ajudar os pobres. Com seu jeito bondoso e humilde, virou exemplo de virtude e compaixão. Era temido e amado pelo seu talento, tanto no manuseio de facas, como na utilização de ervas para a cura de doenças, fruto da herança trazida do Catimbó. Acabou despertando a raiva dos poderosos, tendo sido assassinado pelas costas, em 1920. Há quem diga que ele foi sepultado em Alhandra, na Paraíba. Sua imagem é a personificação do malandro: terno branco, sapatos bicolores, gravata grená ou vermelha e chapéu panamá, com fita vermelha ou preta.
A linha dos malandros foi, inicialmente, reverenciada pelos devotos do Catimbó, também chamada de Jurema, crença de origem nordestina, a qual Zé Pilintra pertencia e, mais tarde, pela Umbanda. Em 7 de julho de 2022, a Câmara Municipal do Rio de Janeiro instituiu o Dia de Zé Pilintra.
Como podemos ver, não há apenas um estereótipo do malandro. Para alguns, o malandro é a caricatura de um sujeito boêmio, preguiçoso e ladrão. Para outros, um exemplo daqueles que escolheram o caminho da desobediência ao sistema. E há ainda aqueles que o respeitam como entidade espiritual de religião afro-brasileira. De uma forma ou de outra, a figura do malandro foi, definitivamente, incorporada ao folclore brasileiro.
O Samba de Antigamente, por Jana Taliani
O samba originou-se a partir do samba de roda, nascido no Recôncavo Baiano, que é um ritmo associado a uma dança muito parecida com a capoeira, onde as pessoas formavam um círculo e tocavam seus instrumentos como o pandeiro, o atabaque, a viola, dentre outros e, no interior destas rodas, outras pessoas dançavam e rodopiavam.
Após a abolição da escravatura, em 1888, muitos negros baianos dirigiram-se ao Rio de Janeiro, em busca de trabalho, levando suas influências culturais. Pode-se afirmar, portanto, que o samba de roda foi uma das bases para o samba carioca e as derivações que conhecemos na atualidade. Por muitos anos, toda e qualquer manifestação cultural de origem africana era vista com extrema desconfiança e criminalizada.
Porém, o ritmo cadenciado do samba caiu no gosto de alguns intelectuais das elites. Os primeiros compositores eruditos a utilizarem elementos do samba em suas músicas foram Chiquinha Gonzaga e Ernesto Nazareth que deram origem, através desta mistura, ao choro ou “chorinho” como conhecemos. Outro compositor que seguiria o mesmo caminho foi Heitor Villa-Lobos. Somente em 1917 foi gravado no Brasil o primeiro samba, chamado “Pelo Telefone” composto por Mauro de Almeida e Donga.
A partir de então, o samba foi ganhando espaços nos salões da elite carioca e pouco a pouco foi sendo associado ao Carnaval, que até aquele momento tinha somente como trilha sonora as marchinhas. Com a criação e expansão das rádios, surgiram intérpretes do samba como Carmem Miranda, Aracy de Almeida e Francisco Alves que fizeram por popularizar o samba em todo o Brasil e depois no mundo.
Mais tarde, outras modalidades derivaram do samba: o samba-enredo, o samba-canção, o samba-exaltação, o samba de gafieira, a bossa-nova e o pagode. Temos grandes nomes atrelados ao samba em nosso país, sendo eles: Noel Rosa, Cartola, João Nogueira, Dona Ivone Lara, Beth Carvalho, Bezerra da Silva, Ataulfo Alves, Tom Jobim, Vinícius de Moraes, Almir Guineto, Clara Nunes, Martinho da Vila, Zeca Pagodinho, dentre inúmeros talentos.
Em 2005, o samba de roda tornou-se um Patrimônio da Humanidade, título este concedido pela UNESCO na categoria de autênticas manifestações culturais. E, para comemorar a riqueza que é o samba, é comemorado no dia 02 de dezembro o Dia Nacional do Samba.
Ah, o samba…
o samba de roda,
o samba de bossa.
O samba que vive,
vive nas nossas entranhas,
vive em nossas raízes,
vive na alma!
Vive em mim
e em você.
Viva o samba!
O Violão, Um Escândalo, por Cláudia Borges
Parece tão comum o instrumento, violão. Podemos encontrá-lo em um bar sozinho com a voz de acompanhamento, ou em conjuntos, bandas, orquestras. Na internet, há vários vídeos que prometem ensinar a tocar o violão do zero.
O instrumento chegou ao Brasil trazido por portugueses, como viola, ou como violão, já com 6 cordas. Foi elemento da nobreza e da elite. A imperatriz D. Leopoldina, em carta ao irmão, dizia fazer aulas de violão diariamente. Então, por que o violão ganhou essa fama de mau?
Sua associação com os ritmos afro-brasileiros fez a elite olhá-lo com desdém. A nossa elite, que sempre buscou um branqueamento e um eurocentrismo cultural inalcançável, era incapaz (sempre foi) de olhar o país como ele realmente é. Em 1914, o violão foi o responsável por um escândalo na republiqueta brasileira. A primeira dama Nair de Teffé apresentou a música Corta-jaca, de Chiquinha Gonzaga e Machado Careca. Pronto! Foi o prato perfeito para o inimigo político do seu marido, Hermes da Fonseca, aproveitar e fazer um discurso carregado de elitismo. Segundo Rui Barbosa: “O maxixe era a dança mais baixa, mais chula e mais grosseira de todas as danças selvagens, irmã gêmea do cateretê, do batuque e do samba”. O discurso político da elite não se modificou, modernizou-se, mas o alvo é sempre o que está popular no momento. Sempre foi assim.
Mas, voltando ao violão, foi o samba do início do século XX, que deu ao instrumento essa fama. Era de uso de malandro – deixando claro que o “malandro” daquela época era o que conseguia se virar, tocando, cantando, jogando em cassinos, visto que a população negra não conseguia empregos decentes. A elite burguesa da época tratava o samba, bem como os instrumentos e quem os tocava, como perigosos e criminosos. Muitas vezes os instrumentos eram apreendidos ou até mesmo os músicos presos.
Nessa época, tia Ciata, famosa baiana que morava no Rio de Janeiro, já reunia em sua casa músicos que tentavam fugir das proibições e usufruir da sua arte e cultura livremente. O local ficou conhecido como refúgio do samba, que é festa. E animava as noites cariocas da população pobre.
Enquanto foi tocado por negros, o samba e seus instrumentos tinham fama de “música da ralé”. Mas com o tempo, foi ganhando a população branca, através das rádios. Alguns jovens da classe média passaram a produzir samba também. O samba ganhou a elite, se modificando um pouco, deixando de falar das agruras da vida nas favelas, para falar de amor. E lá estava o violão, acompanhando tudo isso.
O violão, quem diria, motivo de escândalos, de prisões por conta da nossa elite burguesa que, só após o branqueamento do samba, passou a amar o instrumento. Antes disso, o olhar desta elite eurocêntrica não conseguia ver a beleza do som daquelas seis cordas.
Já tentei tocar, mas parei depois de conseguir apenas duas notas de forma sofrível. Devia tentar de novo? Com a pouca habilidade que tenho, o violão não merece sofrer em minhas mãos. Fico com a dança do Corta-jaca, gosto do escândalo que envolve essa dança (que acho tão inocente).
Fecho com as palavras do personagem de Lima Barreto, Policarpo Quaresma, para sua irmã, Adelaide: “É preconceito supor-se que todo o homem que toca violão é desclassificado. A modinha é a mais genuína expressão da poesia nacional, o violão é o instrumento que ela pede.”
Receita da Baiana, por Samuel Ferreira
O Orixá come e come com gosto.
Mas Orixá não come qualquer coisa.
Feita de qualquer jeito, em qualquer panela.
A Mãe, a Madrinha ou a Baiana sabe disso.
Há que se ter tempo, dedicação, tempero, zelo e muito axé durante a preparação.
Preparara-se tudo com muito cuidado, na mente, nos diálogos, dias antes …
Antes de arriarem as bandejas, os cheiros, as cores e os gostos já existem.
Já existe no camarão lá na lagoa.
No coentro lá do canteiro.
No tomates e no feijão-fradinho lá da feira.
No dendê quente do tacho.
As mão que arrumam pimentas dedo-de-moça e alguidares,
São as mesmas mãos sagradas que acendem velas, benzem e cuidam dos enfermos.
No passado, essas mãos cuidaram dos que foram violentados.
Na falta da justiça, naquela época, foram a força que equilibrou o sentido para a liberdade.
Alimentavam os famintos que fugiam por dentro das matas.
Revitalizaram os nossos ancestrais em dias de fadiga.
Antes do Acarajé ser Patrimônio Imaterial,
As mãos das Mães e Baianas,
São a legitimação da ancestralidade,
Do amor, da fé e da justiça.
Ingredientes imprescindíveis, pois Orixá não come qualquer coisa.
Capoeira, Protetor de Bandeira, por Marcelo Elo Almeida
— Avia, homem! O cordão de vocês vai sair hoje de noite e não tem ninguém pra proteger o pano? Só tem as pastora e meia dúzia de índio e de batedor de bumbo. Índio não sabe brigar e batedor de bumbo fica de mão ocupada.
— Calma, tia Perciliana. João já falou com os capoeira de Santana. Não vai faltar proteção não.
— Não fala esse nome, Caninha! Se meganha te escuta, tu vai apanhar até falar quem são os capoeira. Entendeu? O Cavanhaque de Ferro fez a limpa uma vez, mandou tudo pra ilha de Noronha. Tu quer ir pra lá?
— Tá bom, tia, não falo mais. Essa história é antiga, é do tempo da Abolição. Nós já virou o século. O Cavanhaque não manda mais.
Era verdade, lá se iam mais de quinze anos desde a perseguição que o novo regime havia praticado contra os capoeiras. Mas ter o marido exilado para um lugar tão longe… As cartas, a princípio respondidas com rapidez por Martim, de repente, cessaram. Tuberculose, cancro, tiro, outra família? Nunca soube o porquê, nunca mais soube dele.
— Não importa. Meganha quer motivo pra bater. E tu e teu primo gosta de dar motivo.
O dia tinha sido péssimo, ninguém queria cocada em sábado de Carnaval. Excitadas, as pessoas só falavam em folia, fantasia, fechavam os quiosques mais cedo. Os que passavam pela praça Tiradentes não se detinham por nada, andar apressado. Nem mesmo os bondes para a Muda estavam nos pontos. Faturamento quase zero. O que se come é o que se vende.
Um tanto atarantada entre tabuleiros cheios de doces, cocadas e pedaços de cana, roupa de baiana pelo avesso, colheres de pau, panelas de bronze, Perciliana não encontra o xequerê de contas amarelas, o seu preferido.
— Que é do xequerê amarelo, Caninha?
Caninha se afasta em direção à porta e diz:
— O policial tomou do João ontem de noite, tia.
— O quê? Vem cá, moleque, que eu vou fazer você e o João engolir todo tabuleiro de rolete de cana que vocês não venderam ontem pra ir pro cordão! Ainda perdem meu xequerê pra polícia! Arre! Ô vontade de voltar pra Salvador!
Caninha está na soleira da porta, hesitando entre se explicar e correr do tamanco que Perciliana tem nas mãos. Não tarda, dobra a esquina a toda velocidade e continua em passo acelerado. Mas ainda dá para ouvir:
— E traz meu xequerê de volta, se não vocês não dorme nem come mais aqui!
Dali da rua da Gamboa até o trapiche do seu Zé Manoel na Sacadura Cabral ia um trecho bom. Mas não estava tão atrasado assim, Caninha ia pensando a passo rápido, ainda assustado com a possibilidade de uma tamancada pelas costas. Seu Zé nem parecia português, bom humor, adorava a alegria dos cordões. Ainda mais a das mulatas. Acabou por concordar em ceder seu espaço nos dias de folia para que ele, João filho da baiana Perciliana e outros foliões se encontrassem antes de saírem pelas ruas da Gamboa. O olho dele brilhava pra Candinha. João que não percebesse nada.
— Bumbo, triângulo, agogô… não tem prato e faca, João?
— Ah! Deve de ter lá no fundo do trapiche, Caninha. E o pano. Que é do pano?
— Aqui. Sem o pau. – Caninha encontra um cabo embaixo de uma das mesas do trapiche, escava um pouco a ponta, prende no cordame do pano e:
— Pronto! Nossa bandeira! Segura, Candinha. Você vai levar ela bem alto, pra todo mundo saber que nós somos o Cachinhos de Ouro.
Em poucos minutos, negros índios transitam entre majestades e rainhas da plebe, cocares e coroas esbarram-se, a bandeira do Cachinhos de Ouro sobressaindo acima de todos. Candinha volteia com o estandarte, solta a saia branca e o sorriso largo e o tempo estanca para João.
— Acho que estamos prontos. – Caninha chega perto do ouvido de João, o alarido de agogôs, bumbos, facas e pratos a exigir um tom de voz mais elevado. João desperta de seu quase transe. – Os amigos de Santana ainda não chegou.
A marcha vai preguiçosamente pela Sacadura Cabral, evoluindo mais para os lados do que para frente. Penas, cocares e tacapes vão abrindo caminho entre alguns poucos transeuntes naquela rua quase sempre de puro trabalho. Carretos e carretos de café, milho e feijão dão lugar naquele sábado de Carnaval aos foliões que, até o dia anterior, levavam e traziam até a praia as sacas das embarcações. João, casacão de príncipe quase arrastando no chão, vai cortejando Candinha, tentativa de mão em sua cintura, lentamente afastada pela guardiã da bandeira.
— O meu cacho guerreiro/ É um grupo brasileiro/ É bela, é bela/ A cabeleira dourada/ Vai cortar um cacho/Para dar à namorada.
O cordão alcança o Largo da Prainha a passos muito lentos, espaço suficiente para que se esparramassem, mas seus integrantes continuam próximos, como que imantados. Do outro lado do largo, outro grupo de foliões já havia depositado os instrumentos no chão, fatigado pela caminhada desde o morro do Castelo. Mal veem a ponta do estandarte do Cachinhos de Ouro, a animação ressurge. O bumbo volta a ressoar, os índios que descansavam encostados às paredes das casas saltam de súbito, tacape à mão.
— Avante, brasileiros! O que diz ser operários/reclamar de nossos mestres/ oito horas de trabalho – vão cantando e se aproximando do Cachinhos de Ouro.
— O que é que o pessoal do Flor do Castelo está fazendo aqui tão longe? – Caninha questiona João, medo nos olhos.
— Não sei, primo. E também não sei por que aquele diabinho está com o xequerê da minha mãe – João aponta para um folião vestido de dominó entre bumbos e agogôs.
Pressentindo o avanço dos primeiros foliões da Flor do Castelo em direção à bandeira, João recua, protegendo Candinha e bandeira contra ataques de índios e pierrôs. Esquiva de um rabo de arraia de um, calcanhar no pé do ouvido de outro, João vai conseguindo afastar aos poucos aqueles que tentam tomar o pavilhão do Cachinhos, sem conseguir evitar um rasgo que vai do meio do pano até embaixo. Volteando em torno de Candinha, na luta de um contra três, ele está em todos os lados quase ao mesmo tempo. Braços e pernas em múltiplos movimentos, em cima e embaixo, à esquerda e à direita, atrás e à frente, algumas vezes no alto também. Mortais, patanas, cabeçadas, aús, rasteiras, cotoveladas, todos os golpes usados em sequência. O cansaço vai tomando conta, mas antes que entregasse os pontos, índios e pierrôs adversários já estão no chão. Candinha e bandeira a salvo. Mal consegue gritar:
— Caninha, o diabinho com o xequerê correu pra Pedra do Sal.
Quanto mais o diabinho corria, mais barulho o chocalho fazia, denunciando seus passos. Acaba por abandonar o instrumento pelo caminho, apenas algumas contas quebradas.
— Ele tá inteiro? Não rachou a cabaça não? Que sorte da minha mãe.
— Não, João. Sorte a nossa!
No quintal, entre os sons daquela fanfarra, João e Candinha vão portando sua bandeira. Perciliana, antes mesmo de colocar a cabeça para fora da janela, reconhece o atrito ritmado de contas e cabaça.
— Tem um caldo aí, tia? Folia dá muita fome.
Fontes:
1) Entrevista de João da Baiana a José Ramos Tinhorão, in “Crítica cheia de graça”, Ramos Tinhorão, José – Empório do Livro – São Paulo – 2010
2) “Ecos da Folia – Uma história social do carnaval carioca ente 1880 e 1920”, Pereira Cunha, Maria Clementina – Companhia das Letras – Rio de Janeiro – 2001
Livros Indicados
Os livros que indicamos de alguma maneira nos tocaram, ou tocaram o mundo literário. Muitos deles foram e são ícones do estudo sobre o tema dessa edição do Literato Dente-de-leão.
Ô Abre Alas – Autor: Duda Oliva
Havia uma cidade cinza – como muitas que existem por aí – onde gente pequena não podia fazer nada de que gente grande não gostasse: não podia cantar, não podia dançar, não podia usar roupas coloridas, não podia, às vezes, nem mesmo abrir as janelas de casa! Mas, um dia, um visitante muito estranho resolveu conhecer a tal cidade e achou que poderia ser uma boa levar dentro de sua capa uma ou duas notas musicais. Em um reencontro com os versos nostálgicos de Chiquinha Gonzaga, o livro conta a história de como a música, a dança e o riso podem levar um pouquinho de calor mesmo aos corações mais frios. Com ilustrações em pastel seco e uma sinfonia crescente de cores, personagens curiosos e estranhos desfilam pelo livro para cantar à união, ao respeito, à liberdade e à folia. Saiba mais…
Essa Gente – Autor: Chico Buarque
Um escritor decadente enfrenta uma crise financeira e afetiva enquanto o Rio de Janeiro colapsa à sua volta. Tragicomédia urgente, o novo romance de Chico Buarque é a primeira obra literária de vulto a encarar o Brasil do agora. Há alguns pontos de contato entre Chico Buarque e o protagonista de Essa gente, seu primeiro livro após a consagração do prêmio Camões. O escritor Manuel Duarte tem esse sobrenome de perfil vocálico idêntico, e gosta de bater perna nos arredores do Leblon. Contudo, o leitor logo descobre que isso conduz a um dos muitos becos sem saída da trama. Saiba mais…
Moça Deitada na Grama – Autor: Carlos Drummond de Andrade
Nessas crônicas escritas já na maturidade, Drummond lança seu olhar para o Rio de Janeiro e seus personagens. Carlos Drummond de Andrade inaugura este volume contemplando uma moça esparramada na grama: “Eu vi e achei lindo. Fiquei repetindo para meu deleite pessoal: ‘Moça deitada na grama. Moça deitada na grama. Deitada na grama. Na grama’. Pois o espetáculo me embevecia. Não é qualquer coisa que me embevece, a esta altura da vida”. Essa e outras situações irrompem nas crônicas de Drummond para provar que a realidade também é feita de lirismo ― e vice-versa. Saiba mais…
Playlist do Samba, por Daiane Carrasco
Literato Dente-de-leão tem várias utilidades, como mostrar para os adolescentes que a vida é muito mais do que K-pop e para os baladeiros de plantão que há mais opções para dançar do que sertanejo universitário. Separamos alguns sambas especiais:
Abaixo a playlist completa, só dar o play para ouvir e continuar rolando a página para conhecer um pouco mais da história de cada uma dessas músicas.
Disponibilizamos também os links individuais de cada música, caso você queira uma específica. O link abrirá em uma nova aba.
Trem das Onze (Adoriran Barbosa) – popularizado pelo grupo Demônios da Garoa, é um clássico samba paulistano, que faz referência a uma extinta linha de trem, a Tramway da Cantareira. Curiosidade: “Faz caringundum” quer dizer: “Fez uma cara de surpresa.”
Adoniran Barbosa – O trem das onze (youtube.com)
Madalena do Jucu (Martinho da Vila) – este samba é um belo samba de roda. Conta a história de uma moça capixaba que vivia nas cercanias da Barra do Jucu, na segunda metade do século XIX. Diz-se que era muito bonita e namoradeira, recebendo a alcunha de Madalena do Jucu.
Martinho da Vila – Madalena do Jucu (youtube.com)
Maneco Telecoteco (Zeca Pagodinho; compositores: Marques, Roberto Lopes) – um sambinha ótimo para um churrasco na laje. É a dor de amor de Maneco, que passa a ir para o botequim tocar seu tamborim para afogar as mágoas. Mas a batida é alegre, como os bons sambas do mestre Zeca Pagodinho!
Zeca Pagodinho – Maneco Telecoteco (youtube.com)
São Gonça (Seu Jorge) – é uma música genial, com um humor ácido a respeito dos constantes engarrafamentos na Ponte Rio-Niterói que castigam quem vive em São Gonçalo – capazes de criar desavenças amorosas! “Mas você creia se quiser…”
Seu Jorge – São Gonça (youtube.com)
Desejo de Amar (Eliana de Lima; compositores: Gabú, Marinheiro) – outro samba paulistano. É uma sofrência de mulher, mas com a classe da voz aveludada de Eliana de Lima.
Eliana de lima – Desejo de Amar (youtube.com)
Identidade (Jorge Aragão) – “Elevador é quase um templo.” Através da simples distinção entre o elevador social e o de serviço, Jorge Aragão escancara as diferenças sociais e, consequentemente, raciais no Brasil. Baita samba!
Jorge Aragão – Identidade (youtube.com)
O Show Tem que Continuar (Beth Carvalho; compositores: Aldir Blanc, Chico Buarque, Montgomerry, Ferreira Nunis, Arlindo Cruz, Moacyr da Luz Silva, Luiz Carlos Baptista, Paulo Cesar Francisco Pinheiro, Paulo Cesar de Oliveira Feital, Nelson Antonio da Silva, Guilherme de Brito Bollhorst, Cláudio Brandini Cartier, Alcides de Aguiar Caminha, Carlos Eduardo Cezar de Andrade Jr.) – samba feito por muitas mãos, compara um relacionamento amoroso a um show, no qual é necessário empenho conjunto para que a música fique boa e encante o público. Foi gravado inúmeras vezes, mas escolhi a versão da eterna madrinha do samba, Beth Carvalho.
Beth Carvalho – O Show Tem Que Continuar (youtube.com)
Timoneiro (Paulinho da Viola; compositores: Paulinho da Viola; Hermínio Bello de Carvalho) – “Não sou eu quem me navega/ Quem me navega é o mar.” Versos poéticos sobre a imprevisibilidade da vida e a voz elegante do Príncipe do Samba embalam qualquer coração!
Paulinho da Viola – Timoneiro (youtube.com)
Cara Valente (Maria Rita; compositor: Marcelo de Souza Camelo) – Quem diria que Marcelo Camelo, do Los Hermanos, comporia este ode à sensibilidade masculina! Interpretado lindamente por Maria Rita, a música conta a história de um rapaz, como tantos por aí, que disfarça sua fragilidade com uma contraditória aura de dureza. Aqui tudo é bom: instrumental, letra e vocal!
Maria Rita – Cara Valente (youtube.com)
A Deus eu peço (Alexandre Pires; compositor: Juanes – A Dios le pido)– Originalmente uma música da Colômbia, é uma batida envolvente, típica das músicas latino-americanas. Vale lembrar que somos latinos! Alexandre Pires regravou e aproximou essa graça dos brasileiros.
Alexandre Pires – A Deus Eu Peço (youtube.com)
Playlist de Samba Enredo, por Daiane Carrasco
Nesta época do ano todo mundo fica na expectativa dos Desfiles das Escolas de Samba do Grupo Especial do Rio de Janeiro. Atire a primeira pedra quem nunca varou a noite para assistir à sua escola preferida na Marquês de Sapucaí! Não sou especialista em Carnaval, mas, humildemente, preparei uma playlist de dez sambas-enredos para o esquenta ou para quem aprecia uma boa viagem à História contada por carnavalescos. Confere aí!
Abaixo a playlist completa, só dar o play para ouvir e continuar rolando a página para conhecer um pouco mais da história de cada uma dessas músicas.
Disponibilizamos também os links individuais de cada música, caso você queira uma específica. O link abrirá em uma nova aba.
O negro que virou ouro lá nas terras do Salgueiro (1992, G.R.E.S. Acadêmicos do Salgueiro, compositores: Tiãozinho do Salgueiro, Sobral, Preto Velho, Efealves, Bala) – Interpretado pelo inesquecível Quinho, o samba versa sobre o café. Apesar de a escola ter o famoso “Peguei um Ita no Norte”, campeão de 1993, tocado e cantado a plenos pulmões, este samba tem um belo jogo de palavras, um simbolismo ingênuo sobre as lendas e a história do café, que foi um ciclo econômico importantíssimo para o país – o ouro negro. “Soca no pilão/ Preto velho mandingueiro/ o negro que virou ouro/ lá nas terras do Salgueiro.” Arte brasileira!
Salgueiro 1992 – O negro que virou ouro lá nas terras do Salgueiro (youtube.com)
Gbala, viagem ao Templo da Criação (1993, 2024, G.R.E.S. Unidos de Vila Isabel) – A letra foi composta por Martinho da Vila. Só por aí já temos uma ideia da poesia do samba-enredo, mas vai além. Foi um enredo revolucionário porque tratava da questão ambiental com a mitologia africana, numa época em que a bandeira do ambientalismo não era popular. Oxalá cria os homens, eles adoecem o mundo e a esperança para salvá-lo são as crianças. Tão genial que será feita uma releitura deste enredo pela Vila neste ano!
Vila Isabel 1993 – Gbala, Viagem ao Templo da Criação (youtube.com)
Mais vale um jegue que me carregue do que um camelo que me derrube… lá no Ceará (1995, G.R.E.S. Imperatriz Leopoldinense, compositores: César Som Livre, Eduardo Medrado, João Estevam, Waltinho Honorato) – Conta a história da Comissão Científica de Exploração, de 1856, na qual naturalistas trouxeram 14 camelos para o Ceará. Os animais, logicamente, não se adaptaram. A escola foi campeã com este enredo.
Imperatriz Leopoldinense 1995 – Mais Vale um Jegue que Me Carregue, que um Camelo que Me Derrube…Lá no Ceará (youtube.com)
Gosto que me enrosco (1995, G.R.E.S. Portela, compositores: Colombo, Gelson, Noca da Portela) – Fundada em 1921, a Portela tem os sambas mais parecidos com os antigos blocos ou “cordões” e este aqui é um primor. A Escola trouxe a história de antigos carnavais. É uma melodia cativante, puxada pelo refrão: “Gosto que me enrosco de você, amor/ Me joga seu perfume/ Hoje eu tô que tô!”. Demais!
Portela 1995 – Gosto Que Me Enrosco (youtube.com)
A viagem da pintada encantada (1996, G.R.E.S. União da Ilha do Governador, compositores: Alberto Varejão e Vicentinho) – Um samba cadenciado, rápido, interpretado por Aroldo Melodia, um dos grandes intérpretes de samba-enredo. Aliás, foi o último que ele cantou antes de deixar sua voz na saudade. Fantástico enredo porque conta a história das religiões afro-brasileiras através da saga da galinha d’angola! Vale a pena ouvir!
União da Ilha do Governador 1996 – A Viagem da Pintada Encantada (youtube.com)
Madeira-Mamoré. A volta dos que não foram. Lá no Guaporé (1997, G.R.E.S. Acadêmicos do Grande Rio, compositores: Sabará, Muralha, Jarbas da Cuíca, Grajaú) – um dos enredos mais bonitos da escola. Belíssimo (confesso que é o meu preferido)! Nêgo dá aula puxando esse samba. Trata da história da construção da ferrovia Madeira-Mamoré, no estado de Rondônia, no início do século XX. “Se a selva é perigosa, meu amor/ Rondônia é alegria, esqueça a dor.” Não tem como não se emocionar!
Grande Rio 1997 – Madeira-mamoré, A Volta dos que não Foram. Lá no Guaporé (youtube.com)
Pará, o mundo místico dos Caruanas nas águas do Patu-Anu (1998, G.R.E.S. Beija-flor de Nilópolis, compositores: Alencar de Oliveira, Baby, Marcão, Noel Costa, Wilsinho Paz) – Neste carnaval, a Beija-flor empatou com a Mangueira. Com um samba primoroso, a escola encantou ao abordar a mitologia indígena dos Caruanas – seres encantados que vivem nas águas. Neguinho da Beija-flor dá um show à parte interpretando essa beleza!
Beija Flor 1998 – E o Mundo Místico dos Caruanas nas Águas do Patu-Anu (youtube.com)
Dom Obá II, rei dos esfarrapados, príncipe do povo (2000, G.R.E.S. Estação Primeira de Mangueira, compositores: Bizuca, Gilson Bernini, Marcelo D’Aguiã, Valter Venenoso) – Embora a Escola não tenha ganhado neste ano, ficando em 7° lugar, é um enredo comovente. Conta a trajetória de Cândido da Fonseca Galvão, conhecido como dom Obá II, pois seu avô era um rei africano, Abiodum, do Império de Oió. Um príncipe negro nas ruas do Rio de Janeiro! A cereja do bolo é a voz potente do saudoso Jamelão.
Mangueira 2000 – Dom Obá ii – Rei dos Esfarrapados, Príncipe do Povo (youtube.com)
História pra ninar gente grande (2019, G.R.E.S. Estação Primeira de Mangueira, compositores: Deivid Domênico, Tomaz Miranda, Mama, Marcio Bola, Ronie Oliveira, Danilo Firmino, Manu da Cuíca, Luiz Carlos Máximo) – A Escola merecidamente foi campeã com este enredo que conta a história dos nossos heróis marginalizados, anônimos, que não estão nos livros da história oficial: negros, mulatos, índios, mulheres e pobres. O refrão arrepia:” Salve os caboclos de julho/ Quem foi de aço nos anos de chumbo/ Brasil, chegou a vez/ De ouvir as Marias, Mahins, Marielles, malês.”
Mangueira 2019 – História pra Ninar Gente Grande (youtube.com)
Pede caju que dou… Pé de caju que dá (2024, G.R.E.S. Mocidade Independente de Padre Miguel, compositores: Diego Nicolau, Paulinho Mocidade, Marcelo Adnet, Richard Valença, Orlando Ambrosio, Gigi da Estiva, Lico Monteiro e Cabeça do Ajax) – Este ano a Mocidade aposta na história do caju. Está elencado nesta seleção, apesar de não ter pisado na Sapucaí, porque é um samba com a pegada dos carnavais da década de 80: alegre, leve, fácil de cantar. Além disso, evoca movimentos culturais relevantes para o país, como o Modernismo, na figura de Tarsila do Amaral, e o Tropicalismo. Será que vai ser campeã? Não sabemos… mas o samba é de primeira!
Mocidade Independente 2024 – Pede caju que dou… Pé de caju que dá (youtube.com)
Corpo Editorial
Designer e Criação
Sérgio Fernandes
Consultor de T.I. & Terapeuta Corporal
Instagram: @sehfernandes
Site: sehfernades.com.br
Autor do Livro Zé das Campas
Escritores da Edição nº 06 de 2024 – Samba
Jana Taliani
Terapeuta especialista em Mentoring e
Desenvolvimento Humano
Instagram: @jana_taliani | YT: @janataliani
Site: janataliani.com.br
Autora dos Livros Ho’oponopono
& O Poder dos Salmos
Cláudia Borges
Técnica Administrativa na FURG
Instagram: @claudia.borges.cacau
Além do Mulherio das Letras, participa do coletivo Escritores de Quinta e Poetas Papareia e dos grupos de pesquisa Poéticas Orais e Pensamento Decolonial e Literatura e Identidade na América Latina
Coautora do Livro Delírios de Quinta
Paulo Câncio
Escritor & Pianista
Instagram: @paulocanciodesouza
Autor dos Livros Trajetória de Aventureiro
& Momentos da Vida (Direto com Autor)
Samuel Ferreira
Historiador
Instagram: @umbarrildesamuka